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Eleição em Porto Velho: paradoxos da disputa na capital do bolsonarismo

João Paulo Viana*

Créditos: Divulgação


            Porto Velho pode ser considerada a capital brasileira de maior adesão ao bolsonarismo e à direita radicalizada. Embora quando comparada historicamente ao interior rondoniense, especialmente a parte leste da BR-364, a cidade tenha uma trajetória eleitoral mais aberta ao campo progressista, seguramente hoje a capital de Rondônia também se constitui como um dos maiores redutos da nova direita brasileira, com numeroso eleitorado evangélico. Governada há quase oito anos por Hildon Chaves (PSDB), ex-promotor de Justiça e empresário do ramo educacional, eleito em 2016 como um outsider em meio à onda antipolítica que varreu o país em importantes capitais, Chaves segue, às vésperas de concluir seu segundo mandato, com uma taxa de mais de 80% de aprovação popular.

 

          Embora inegavelmente tenham ocorrido avanços nesse período, principalmente em relação às questões de infraestrutura, um paradoxo evidencia-se em números que apontam para a cidade como a pior capital do país em qualidade de vida. Esse dado baseia-se no ranking do Índice de Desafios da Gestão Municipal (IDGM, 2021) das capitais brasileiras, que leva em consideração quatro áreas essenciais para a qualidade de vida da população: educação, saúde, segurança e saneamento/sustentabilidade.


Conforme dados do Instituto Trata Brasil divulgados em abril de 2024, menos da metade da população de Porto Velho possui acesso à água potável (41,8%), apenas 9,9% tem coleta de esgoto, e a cidade trata somente 1,7% do esgoto gerado. Ademais, desde o início de agosto, a capital rondoniense enfrenta uma crise ambiental aguda com milhares de focos de incêndio, com uma das piores qualidades do ar no mundo.

 

           Diante de uma coleção de títulos indesejáveis, é possível ter uma noção dos grandes desafios do próximo prefeito portovelhense. Nesse contexto, sete nomes concorrem à prefeitura da cidade. Conforme a primeira pesquisa Quaest, divulgada no final de agosto, a ex-deputada federal Mariana Carvalho (União Brasil) segue isolada com 51% das intenções de votos. Em segundo lugar aparece o ex-deputado federal Léo Moraes (Podemos) com 18%, seguido pela juíza aposentada Euma Tourinho (MDB), com 4%. Candidato da frente de esquerda, o advogado pedetista Célio Lopes ocupa a quarta colocação, com 3% das intenções de votos. Samuel Costa (REDE), com 2%, é o quinto colocado, e logo depois aparecem Benedito Alves (Solidariedade) e Ricardo Frota (NOVO) empatados com apenas 1% cada um.

 

           Ainda que a pesquisa citada reflita o momento inicial da campanha, é inconteste o favoritismo de Mariana Carvalho. A ex-parlamentar conseguiu arregimentar um amplo leque de alianças com mais de dez partidos, e conta com o apoio do governador, Cel Marcos Rocha (União Brasil), do prefeito Hildon Chaves (PSDB), de lideranças da bancada federal, da assembleia legislativa e praticamente da totalidade dos 21 vereadores, além de uma campanha com muitos recursos financeiros e tempo de rádio e TV bem superior ao dos demais candidatos. Embora seja cedo para afirmar, existem possibilidades reais de a eleição ser decidida em primeiro turno.

 

          Todavia, há dois nomes hoje que podem mudar os rumos da eleição e evitar uma vitória de Mariana Carvalho já no primeiro turno. O ex-deputado federal Léo Moraes (Podemos) é um ator de relevância na política rondoniense. Político experiente e puxador de votos reconhecido, Moraes foi eleito o parlamentar federal mais votado do estado em 2018 e ainda pode crescer na campanha, especialmente a partir dos debates eleitorais. É tido por muitos analistas locais como o único candidato com chances de chegar ao segundo contra a candidata do União Brasil.

 

        Mas a juíza aposentada Euma Tourinho (MDB) também tem chances de crescimento. De família tradicional da capital, Tourinho sabe que o atual governador do estado e o prefeito de Porto Velho chegaram às urnas como ilustres desconhecidos da grande parcela do eleitorado. Ainda que a conjuntura não seja a mesma de 2016 e 2018, quando outsiders alcançaram o poder em vários lugares do país, a dinâmica da política brasileira nos últimos anos tem mostrado que conjunturas podem mudar rapidamente. Seguramente, qualquer possibilidade de um 2º turno passa por um bom desempenho de Léo Moraes e Euma Tourinho no 1º turno da campanha.

 

           Mais um paradoxo da eleição em Porto Velho pode ser observado no candidato da frente de partidos de esquerda e centro-esquerda. Nome do PDT avalizado pelo ex-senador Acir Gurgacz na disputa, o jovem advogado Célio Lopes ganhou o apoio da federação de PT-PV-PC do B, mas até agora não se apresentou como o candidato de Lula na disputa. Esse fato tem incomodado setores do PT que abriram mão de candidatura própria. Assim, é notória a possibilidade de parte considerável do eleitorado petista abandonar a candidatura de Lopes caso a situação perdure.

 

           Cumpre mencionar que, sob muito fogo e fumaça das queimadas, a campanha em Porto Velho se iniciou trazendo consigo um elemento já observado em disputas anteriores, porém, de difícil compreensão no momento atual: o meio ambiente como antipauta. No primeiro dia de HGPE, apenas o candidato da REDE, Samuel Costa, abordou a questão ambiental. Pesquisas realizadas nas principais cidades da região amazônica pelo Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal (LEGAL) tem apontado para uma relação de trade-off entre o tema do meio ambiente e a economia. Embora não seja uma característica apenas de Porto Velho, impressiona, tendo em vista a realidade local, o esvaziamento de um tema, literalmente, tão candente hoje.

 

* João Paulo Viana é professor de Ciência Política da UNIR e pesquisador do LEGAL.

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